Coordenador de indústria não receberá minutos residuais como horas extras

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a validade de cláusula coletiva que havia excluído o cômputo, como horas extras, dos dez minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho. Com isso, a empresa não terá de pagar o período a um coordenador de corte de sua unidade em Parobé (RS).

 

Desconsideração

Na ação trabalhista, o coordenador disse que havia trabalhado para a Azaléia de 1986 a 2014. Entre outros pedidos, sustentou que os períodos de até dez minutos antes e depois da jornada não eram pagos pela empresa como extraordinários, com a justificativa de que norma coletiva autorizava a sua desconsideração.

 

Limite

 

O pedido foi deferido em sentença e confirmado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que considerou inválidas as cláusulas coletivas em que a empregadora havia se baseado para apurar a jornada do empregado ao longo do contrato. 

 

Conforme o TRT, o parágrafo 1º do artigo 58 da CLT regula a matéria de forma específica, estabelecendo que não são descontadas nem computadas as variações que não ultrapassem cinco minutos, observado o máximo de dez minutos diários. Assim, a autonomia das vontades coletivas não poderia afastar garantias mínimas como o limite de duração do trabalho. 

 

Vontade das partes

 

No recurso ao TST, a empresa sustentou que as normas coletivas refletem a vontade das partes envolvidas. Argumentou, ainda, que é impossível que todos os empregados registrem sua jornada ao mesmo tempo, daí ter sido convencionada a tolerância de dez minutos.

 

Jurisprudência recente do STF

 

Para o relator, ministro Douglas Alencar Rodrigues, o elastecimento do limite de tolerância dos minutos que antecedem e que sucedem a jornada de trabalho para além dos cinco minutos estabelecidos na CLT, quando previsto em norma coletiva, é plenamente válido. 

 

Ele lembrou que o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de repercussão geral (Tema 1.046) de que as cláusulas coletivas que afastem ou limitem direitos devem ser integralmente cumpridas e respeitadas, salvo quando se tratarem de direitos indisponíveis – como as regras de proteção à saúde e à segurança do trabalho. Na visão do relator, este não é o caso discutido no processo.

 

Reforma Trabalhista

 

O ministro observou, ainda, que, nesse mesmo sentido, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), posterior à interposição do recurso julgado pelo STF e ao contrato de trabalho do coordenador da empresa, definiu com clareza, no artigo 611-A da CLT, quais seriam os direitos transacionáveis (jornada de trabalho, banco de horas, intervalo intrajornada, teletrabalho, registro de jornada e participação nos lucros, entre outros).

 

O artigo 611-B, por sua vez, relaciona os direitos que estariam blindados à negociação coletiva (depósitos e indenização rescisória do FGTS, salário mínimo, 13º salário, repouso semanal, adicional de horas extras, férias, licença-maternidade e paternidade, direito de greve e outros). “Entre eles não se inserem, obviamente, direitos de índole essencialmente patrimonial”, concluiu.

 

A decisão foi unânime.

 

Ementa do acórdão:

 

I – AGRAVO DE INSTRUMENTO EMRECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI13.015/2014.

1. ACORDO DECOMPENSAÇÃO SEMANAL DE JORNADA.BANCO DE HORAS. CONCOMITÂNCIA.INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS DEVALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. Esta Corte Superior entende pela possibilidade de cumulação entre os regimes de compensação semanal de jornada e de banco de horas, desde que se observem os requisitos de validade dos sistemas compensatórios. No caso presente, o Tribunal Regional, soberano na análise de fatos e provas, declarou a invalidade do regime de compensação semanal de jornada e do banco de horas. Consignou que, muito embora houvesse a previsão em instrumento coletivo acerca da adoção do regime semanal de compensação e do banco de horas, a própria Reclamada descumpriu o pactuado. Anotou que restou comprovada a prestação habitual de horas extras por todo o período laboral, inclusive com trabalho aos sábados em diversas oportunidades. Destacou, ainda, que não foi respeitado o limite máximo de dez horas de trabalho diário, previsto no artigo 59,§ 2º, da CLT. Desse modo, constatada a irregularidade dos sistemas de compensação de jornada, inviável se torna a concomitância dos regimes compensatórios, devendo ser mantida a condenação ao pagamento de horas extras. A alteração dessa conclusão demandaria o revolvimento de fatos e provas, expediente vedado nessa esfera recursal, ante o óbice da Súmula126/TST, inviabilizando a análise da apontada violação de dispositivos da Constituição Federal e de lei. 

2. UNICIDADE CONTRATUAL. SÚMULA126/TST. O Tribunal Regional, com amparo nas provas dos autos, registrou que o Reclamante “manteve os seguintes contratos de trabalho com a reclamada: de 10.03.1986 a 01.06.1992 e de 02.06.1992 a 05.06.2014”. Destacou que “o reclamante continuou a desenvolver atividades relacionadas à atividade fim da empresa, figurando como empregado dessa, não havendo qualquer solução de continuidade na prestação dos serviços, o que impõe o reconhecimento da unicidade contratual”. Ressaltou ser “inconteste a continuidade da prestação laboral”. Nesse cenário, somente com o revolvimento de provas seria possível conclusão diversa, o que não se admite nesta instância extraordinária, ante o óbice da Súmula 126/TST. A questão não restou solucionada sob o enfoque do artigo 5º, XXXVI, da CF, carecendo de prequestionamento, nos termos da Súmula 297/TST. Além disso, não há violação dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC, na medida em que as regras de distribuição do ônus da prova somente têm relevância num contexto de ausência de provas ou de provas insuficientes, o que não é a hipótese presente.

3. ADICIONAL NOTURNO.SÚMULA 126/TST. O Tribunal 
Regional, após exame das provas dos autos, registrou que, “do cotejo dos cartões-ponto e dos recibos de pagamento, observo períodos em que realizado trabalho em horário noturno sem o devido pagamento. Como exemplo, cito o período de19.06.2009 a 31.07.2009, no qual realizada a jornada das 14h49min às 00h17min, sem pagamento a título de adicional noturno nos recibos salariais correspondentes”. Concluiu que “há diferenças de adicional noturno sobre as horas trabalhadas em horários noturno em favor do trabalhador”. Logo, somente com o revolvimento de provas seria possível conclusão diversa, o que não se admite nesta instância extraordinária, ante o óbice da Súmula 126/TST.


4. HORAS 
EXTRAS.MINUTOS QUE ANTECEDEM E QUE SUCEDEMA JORNADA DE TRABALHO.FLEXIBILIZAÇÃO POR NORMA COLETIVA.VALIDADE. Demonstrada possível ofensa ao artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal, impõe-se o provimento do agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e parcialmente provido.

 II – RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 
13.015/2014.

1. HORAS EXTRAS.MINUTOS QUE ANTECEDEM E QUE SUCEDEMA JORNADA DE TRABALHO.FLEXIBILIZAÇÃO POR NORMA COLETIVA.VALIDADE.

1. Hipótese em que o Tribunal Regional declarou a invalidade da norma coletiva em que previsto o elastecimento de 10 minutos que antecedem e que sucedem a jornada de trabalho para fins de apuração das horas extras.

2. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada em 02/06/2022, apreciou o Tema 1.046 do ementário de 
repercussão geral e deu provimento ao recurso extraordinário (ARE1121633) para fixar a seguinte tese: “São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”. Portanto, segundo o entendimento consagrado pelo STF, as cláusulas dos acordos e convenções coletivas de trabalho, nas quais previsto o afastamento ou limitação de direitos, devem ser integralmente cumpridas e respeitadas, salvo quando, segundo a teoria da adequação setorial negociada, afrontem direitos gravados coma nota da indisponibilidade absoluta. Embora não tenha definido o STF, no enunciado da Tese 1046,quais seriam os direitos absolutamente indisponíveis, é fato que eventuais restrições legais ao exercício da autonomia da vontade, no plano das relações privadas, encontra substrato no interesse público de proteção do núcleo essencial da dignidade humana (CF, art. 1º, III), de que são exemplos a vinculação empregatícia formal(CTPS), a inscrição junto à Previdência Social, o pagamento de salário mínimo, a proteção à maternidade, o respeito às normas de proteção à saúde e segurança do trabalho, entre outras disposições minimamente essenciais. Nesse exato sentido, a recente Lei 13.467/2017 definiu, com clareza, conferindo a necessária segurança jurídica a esses negócios coletivos, quais seriam os direitos transacionáveis (art. 611-A da CLT) e quais estariam blindados ao procedimento negocial coletivo (art. 611-B da CLT). Ao editar a Tese1.046, a Suprema Corte examinou recurso extraordinário interposto em instante anterior ao advento da nova legislação, fixando, objetivamente, o veto à transação de “direitos absolutamente indisponíveis”, entre os quais não se inserem, obviamente, direitos de índole essencialmente patrimonial, inclusive suscetíveis de submissão ao procedimento arbitral (Lei9.307/96), como na hipótese, em que se questiona os efeitos jurídico-patrimoniais que decorrem da elisão do § 1º do artigo 58 da CLT e consequente condenação ao pagamento de horas extras.

3. O elastecimento do limite de tolerância quanto aos minutos que antecedem e que sucedem a jornada de trabalho para além de 5 minutos para fins 
de apuração das horas extras, quando previsto em norma coletiva, é plenamente válido e deve ser respeitado, sob pena de maltrato ao art. 7º, XXVI, da CF, impondo-se o reconhecimento da validade da cláusula coletiva, por não se tratar de matéria albergada pela vedação imposta na tese firmada pela Suprema Corte. Configurada a violação do art. 7º, XXVI da CF. Recurso de revista conhecido e provido.

2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.SÚMULA 219 DO TST. Infere-se do acórdão regional que o Reclamante não está assistido por advogado credenciado no sindicato representativo da sua categoria profissional, de modo a justificar o deferimento de honorários advocatícios. Desse modo, verifica-se que a decisão contraria o disposto na Súmula 219/TST. Recurso de revista conhecido e provido.”

 

 

 

 

Fonte: Notícias do TST  (vinculado no site https://www.tst.jus.br).

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