O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, deferiu liminar e suspendeu os efeitos de decisão do TRT da 2ª região que manteve cláusulas de acordo coletivo possibilitando o desconto de contribuição assistencial sem autorização expressa e individual dos empregados. A decisão atendeu ao pedido de concessionárias de rodovias.
Entenda o caso
Em setembro do ano passado, o ministro já havia cassado sentença do Tribunal por permitir cláusulas de acordo coletivo prevendo desconto de contribuição sindical sem autorização expressa e individual do trabalhador (Rcl 47.102).
Em novo julgamento, o TRT da 2ª região interpretou restritivamente a decisão da Rcl 47.102, no sentido de que a ADIn 5.794, que declarou a constitucionalidade do fim da contribuição sindical obrigatória, somente tratou de contribuição sindical e não das demais contribuições em favor do sindicato.
Com base nisso, admitiu contribuição assistencial criada por assembleia sindical e direcionada a todos os membros da categoria, sem necessidade de autorização individual e expressa do empregado.
As empresas noticiaram o descumprimento da decisão do STF nos autos da Rcl 47.102, mas o ministro Barroso (também relator da primeira reclamação) entendeu que com a concessão da liminar e julgamento definitivo do mérito a reclamação já havia se exaurido, sendo necessária outra medida contra nova decisão do TRT-2.
Íntegra da decisão:
“1. Trata-se de reclamação, com pedido liminar, em que se impugna sentença normativa única da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, que julgou parcialmente procedente ação civil coletiva ajuizada pelo Sindicato ——————— em face da Concessionária ————–, Concessionária —————, ——————–, Concessionária ————–, Companhia —————-, ora reclamantes (Autos nºs 100370779.2020.5.02.0000, 1003710-
34.2020.5.02.000 e 1003728-55.2020.5.02.0000). Os dissídios foram julgados de forma conjunta, por envolverem empresas do mesmo grupo econômico (Grupo ———-), com acordos coletivos semelhantes negociados com o mesmo Sindicato.
2. Na origem, a autoridade reclamada, em cumprimento à decisão por mim proferida na Rcl 47.102, prolatou nova sentença normativa, na qual considerou que apenas a “contribuição sindical negocial” foi atingida pela decisão da referida reclamação, motivo pelo qual, no mérito, manteve a decisão anterior quanto às demais contribuições objeto de demanda do suscitante. No ponto que diz respeito à presente reclamação, assentou: (i) quanto à contribuição assistencial, “adoto o entendimento majoritário desta Sessão de Dissídios Coletivos”, “para fixar que pode ser criada por assembleia sindical e direcionada a todos os membros da categoria, assegurado o direito de oposição, conforme especificação na análise individualizada de cada cláusula nesta sentença”; e (ii) quanto à contribuição sindical negocial, “em obediência à decisão proferida na Reclamação 47.102/SP, já referida acima, rejeito a autorização assemblear como suficiente para sua criação e altero a redação da cláusula para constar que é necessária autorização prévia e expressa de cada associado”.
3. As empresas reclamantes alegam que a nova sentença normativa, “com base em interpretação absolutamente arrevesada e a pretexto de ‘descortinar a abrangência da decisão da RCL 47.102’, novamente contrariou a decisão deste C. STF na ADI 5.794”.
4. Nesse contexto, requerem, em caráter liminar, a suspensão da “nova sentença normativa proferida pela MM. Seção de Dissídios Coletivos do E. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região nos dissídios coletivos nº 1003707-79.2020.5.02.0000, 1003710-34.2020.5.02.0000 e 1003728- 55.2020.5.02.0000, no que diz respeito às cláusulas que permitem o desconto de quaisquer contribuições em favor do sindicato sem autorização prévia e expressa dos empregados”. Ao final, postulam pela procedência da presente reclamação, para cassar a decisão reclamada.
5. A presente reclamação foi a mim distribuída por prevenção, justificada pela Rcl 47.102.
6. É o relatório. Decido o pedido liminar.
7. Os sindicatos e sistema confederativo sindical possuem as seguintes fontes de custeio mantidas pelos trabalhadores: (i) a contribuição confederativa (art. 8º, IV, da CF); (ii) a contribuição assistencial (art. 513, e, da CLT); (iii) a contribuição sindical (art. 579 da CLT e art. 149 da CF/88); e (iv) a mensalidade sindical (art. 5º, XX, da CF). Todas essas espécies demandam, em razão de previsões legais e construções jurisprudenciais, a autorização do trabalhador, salvo, exclusivamente no período anterior à vigência da Lei nº 13.467/2017, a contribuição sindical.
8. Quanto à contribuição confederativa, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) converteu a Súmula nº 666 da sua jurisprudência dominante na Súmula Vinculante nº 40, com a seguinte redação “A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição Federal só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo”.
9. Quanto à contribuição assistencial, em 23.02.2017, o Plenário do STF concluiu o julgamento do Tema 935 da repercussão geral (ARE 1.018.459-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes), fixando a tese segundo a qual “É inconstitucional a instituição, por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, de contribuições que se imponham compulsoriamente a empregados da categoria não sindicalizados”.
10. Sobre as contribuições sindicais, o Plenário do STF julgou improcedente a ADI 5.794, red. p/o acórdão o Min. Luiz Fux, em que se alegou a inconstitucionalidade da redação dada pela Lei federal nº 13.467/2017 aos arts. 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da Consolidação das Leis Trabalhistas. Afirmou-se, assim, a validade do novo regime voluntário
de cobrança de contribuição sindical. Confiram-se o teor dos dispositivos impugnados, na redação dada pela Lei nº 13.467/2017, anterior à MP nº 873/2019:
“Art. 545. Os empregadores ficam obrigados a descontar da folha de pagamento dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao sindicato, quando por este notificados.
(…)
Art. 578. As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das
profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas.
(…)
Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que
participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação.
(…)
Art. 582. Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de
março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos.
Art. 583. O recolhimento da contribuição sindical referente aos empregados e trabalhadores avulsos será efetuado no mês de abril de cada ano, e o relativo aos agentes ou trabalhadores autônomos e profissionais liberais realizar-se-á no mês de fevereiro, observada a exigência de autorização prévia e expressa prevista no art. 579 desta Consolidação.
(…)
Art. 587. Os empregadores que optarem pelo recolhimento da contribuição sindical deverão fazê-lo no mês de
janeiro de cada ano, ou, para os que venham a se estabelecer após o referido mês, na ocasião em que requererem às repartições o registro ou a licença para o exercício da respectiva atividade.
(…)
Art. 602. Os empregados que não estiverem trabalhando no mês destinado ao desconto da contribuição sindical e que
venham a autorizar prévia e expressamente o recolhimento serão descontados no primeiro mês subsequente ao do reinício do trabalho” (destaques acrescentados).
11. A leitura dos dispositivos declarados constitucionais por esta Corte aponta ser inerente ao novo regime das contribuições sindicais a autorização prévia e expressa do sujeito passivo da cobrança. Tal ponto foi analisado na ADI 5.794, tendo a maioria do Plenário concluído pela extinção da compulsoriedade da contribuição:
“EMENTA: (…)
4. A Lei nº 13.467/2017 emprega critério homogêneo eigualitário ao exigir prévia e expressa anuência de todo e
qualquer trabalhador para o desconto da contribuição sindical, ao mesmo tempo em que suprime a natureza tributária da contribuição, seja em relação aos sindicalizados, seja quanto aos demais, motivos pelos quais não há qualquer violação ao princípio da isonomia tributária (art. 150, II, da Constituição), até porque não há que se invocar uma limitação ao poder de tributar para prejudicar o contribuinte, expandindo o alcance do tributo, como suporte à pretensão de que os empregados nãosindicalizados sejam obrigados a pagar a contribuição sindical.
5. A Carta Magna não contém qualquer comando impondo a compulsoriedade da contribuição sindical, na medida
em que o art. 8º, IV, da Constituição remete à lei a tarefa de dispor sobre a referida contribuição e o art. 149 da Lei Maior, por sua vez, limita-se a conferir à União o poder de criar contribuições sociais, o que, evidentemente, inclui a prerrogativa de extinguir ou modificar a natureza de contribuições existentes.
6. A supressão do caráter compulsório das contribuiçõessindicais não vulnera o princípio constitucional da autonomia da organização sindical, previsto no art. 8º, I, da Carta Magna, nem configura retrocesso social e violação aos direitos básicos de proteção ao trabalhador insculpidos nos artigos 1º, III e IV, 5º, XXXV, LV e LXXIV, 6º e 7º da Constituição”.
12. A legitimação da cobrança daquelas contribuições de forma compulsória, sem previsão legal, afronta a autonomia da vontade do trabalhador e sua liberdade de manter-se ou não associado ao sindicato, garantia elencada na categoria de direitos fundamentais (art. 5º, XX, da Constituição).
13. No caso em exame, após a decisão da Rcl 47.102, de minha relatoria, a autoridade reclamada proferiu nova sentença normativa em que rejeitou “a autorização assemblear como suficiente para sua criação e altero a redação da cláusula para constar que é necessária autorização prévia e expressa de cada associado”. No tocante à contribuição assistencial, considerou que “pode ser criada por assembleia sindical e direcionada a todos os membros da categoria”.
14. Tal interpretação, aparentemente, esvazia o conteúdo das alterações legais declaradas constitucionais pelo STF, no julgamento da ADI 5.794, red. p/o acórdão o Min. Luiz Fux, além da tese fixada no Tema 935 da repercussão geral, o que implica afronta à autoridade desta Corte. Nesse sentido, confiram-se: Rcl 49.729-MC, Rel. Min. Edson Fachin; Rcl 36.933, Rel. Min. Ricardo Lewadowski; e Rcl 43.246-ED, Rel. Min. Dias Toffoli.
15. Presente, portanto, o fumus boni iuris. Igualmente configurado o periculum in mora. Para além da necessidade de se evitar o desperdício da atividade jurisdicional, os recursos trabalhistas não possuem, como regra, efeito suspensivo (art. 899, caput, da CLT). De modo que a decisão impugnada poderia ser executada provisoriamente, recomendando o deferimento da medida liminar.
16. Diante do exposto, defiro a medida cautelar, para suspender os efeitos da decisão reclamada (Autos nºs 1003707-
79.2020.5.02.0000, 1003710-34.2020.5.02.000 e 1003728-55.2020.5.02.0000), impedindo sua exequibilidade.
17. Notifique-se a autoridade reclamada para (i) prestar as informações e (ii) intimar a parte beneficiária do ato reclamado acerca da presente decisão, para que, querendo, impugne o pedido, nos autos da presente reclamação.
18. Após a manifestação das partes ou esgotamento do prazo, abra-se vista à Procuradoria-Geral da República.
Publique-se. Comunique-se.”
Processo: Rcl 51.987 (STF).
Fonte: Migalhas (vinculado no site www.migalhas.com.br)”